DIVULGA CIÊNCIA

Valorizando os periódicos brasileiros através da divulgação científica

|Reportagem| Editores discutem desafios na divulgação de revistas científicas em redes sociais

Por Kátia Kishi

Solange Santana, Silvia Galleti, Roberta Cerqueira e Atila Iamarino discutem a divulgação em redes sociais. Credito de imagem: Germana Barata

Solange Santana, Silvia Galleti, Roberta Cerqueira e Atila Iamarino discutem a divulgação em redes sociais. Crédito de imagem: Germana Barata

“As revistas científicas tradicionalmente comunicam para pares. Mas já é tempo de ampliarem o público e falarem para especialistas de outras áreas, para a mídia e para a sociedade. E uma boa divulgação precisa de estratégia.”, apontou a pesquisadora do Labjor/Unicamp, Germana Barata, para dar início às discussões da mesa sobre “A importância da divulgação científica brasileira através das mídias e redes sociais”, na qual foi mediadora na 67ª Reunião Anual da SBPC.

Para compreender as melhores estratégias, além de compartilhar a superação de dificuldades como a linguagem das redes sociais, financiamento e profissionalização, foram convidados para debater Silvia Galleti, vice-presidente da Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC), Atila Iamarino, pesquisador com experiência em divulgação científica em blogs e vídeos no YouTube, Roberta Cardoso Cerqueira editora da revista científica História, Ciências, Saúde – Manguinhos (Fiocruz) e Solange Santana, editora da Revista Brasileira de Educação Física e Esporte (RBEFE) da Universidade de São Paulo.

Segundo Galleti, o debate que ocorreu em julho na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), interior de São Paulo, é necessário porque muitos editores ainda não compreendem a importância do investimento em divulgação científica, quanto mais via redes sociais, o que só tende a prejudicar o número de acesso e democratização desses periódicos. A vice-presidente da ABEC também destaca que a divulgação passa a ser exigência de muitas bases de indexação, como a SciELO (Scientific Eletronic Library Online), que publicou em setembro de 2014 o arquivo “Critérios, política e procedimentos para a admissão e a permanência de periódicos científicos na Coleção SciELO Brasil”. Nele consta um item que determina que a partir deste mês de julho, todos os periódicos da base devem ter “um plano operacional de marketing e divulgação” que contenha o desenvolvimento de press releases, textos enviados para veículos de comunicação desenvolverem matérias, publicados no blog SciELO e seu portal, a exemplo de outros periódicos internacionais em portais como EurekaAlert! e AlphaGalileo.

Entre os critérios exigidos pela SciELO, também há o desenvolvimento de materiais para diversas redes sociais (como Twitter, Facebook, Academia.edu, Mendeley, ResearchGate, etc). Atila Iamarino explica que a tendência é a inserção das revistas nas mídias sociais e a mudança nas mediações, pois os tradicionais índices de impacto, calculados principalmente pelo número de citações, não conseguem avaliar por completo um artigo. Com o Altimetrics (Métricas alternativas) é possível avaliar outros aspectos como quantos downloads e visualizações, além de dados sobre comentários e compartilhamentos. As métricas alternativas também trazem vantagens para o autor, como o “rastreador” ImpactStory que mapeia os acessos de toda a produção de um pesquisador, como artigos (pesquisa), visualização de slides de aulas (ensino) e outras produções, como vídeos, blogs e reportagens (divulgação e extensão).

Iamarino também exemplifica que como “consumidor de artigos”, prioriza a leitura de textos que foram recomendados pelas redes sociais e que outros pesquisadores de sua área já indicaram. Segundo ele, a diferença ocorre pelo “tom dos comentários” que indiretamente filtra os melhores artigos. Outros exemplos que o pesquisador ressalta sobre as possibilidades dos Altimetrics, é que muitos artigos são conclusivos de área, ou seja, fecham uma área de pesquisa e, consequentemente, não terá tantas citações, mas isso não diminui sua relevância ou leitura; ou casos contrários, como de artigos com falhas graves que são muito citados, mas não porque são essenciais e sim por serem refutados em novas pesquisas.

Os benefícios da divulgação das redes sociais são crescentes, mas Galleti adverte que não é aconselhável criar perfis apenas para cumprir as exigências das bases de indexação, ou publicar sem que a linha editorial da revista mantenha a ética dos conteúdos divulgados, pois o efeito pode ser o contrário.

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Redes sociais e suas dificuldades

Durante o encontro, as editoras Roberta Cerqueira da revista “História, Ciências e Saúde Manguinhos” e Solange Santana da “Revista Brasileira de Educação Física e Esporte” compartilharam os desafios da inserção nas redes sociais.

No caso da revista história de Manguinhos, Cerqueira explicou que desde sua criação em 1994, houve uma preocupação de não deixar o trabalho estagnar no lançamento dos fascículos. Por exemplo, na década de 90 a revista enviava press releases de artigos com a versão impressa da edição para os principais jornais do Brasil, mas, na época, houve pouco retorno desses veículos. O foco na divulgação científica se manteve e após alguns seminários sobre formas diferentes para dar visibilidade às revistas, a equipe decidiu investir nas redes sociais em 2013.

A fim de promover melhorias com qualidade, Cerqueira destaca que foi necessário buscar financiamento, tanto na Fiocruz quanto de editais, como de inovação do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Com os recursos disponíveis, puderam desenvolver dois portais (um em inglês e outro em português, com conteúdos não espelhados) e expandir a equipe, “chamamos duas jornalistas para nos ajudar por causa do problema da linguagem, eu como historiadora, por exemplo, tenho um tolhimento da área que me impedia de fazer uma publicação mais leve”, justifica a editora. A necessidade de adequar a linguagem também foi observada por Galleti durante o desenvolvimento das redes de divulgação da ABEC, e em sua equipe também integra uma profissional que se dedica apenas à divulgação das revistas.

Já a editora Solange Santana teve mais dificuldades em implementar mudanças, pois a equipe editorial é composta por apenas dois funcionários. No entanto, a necessidade em expandir o público leitor do periódico fez com que persistissem na tarefa. “A revista não era nem conhecida dentro da própria Faculdade de Educação Física da USP e hoje temos mais acessos que as redes institucionais”, comemora.

As duas editoras concordam que, para o trabalho eficaz, é necessário estar constantemente conectado nesses meios de comunicação. Cerqueira exemplifica que a revista de “História, Ciência e Saúde – Manguinhos” está atenta para moderação de comentários porque debate temas polêmicos no blog, como um post sobre as relações históricas do caso recente do homem que foi linchado em São Luís (MA) com os castigos da escravidão.

No caso da RBEFE, com mais de seis mil fãs no Facebook, Santana calcula que cerca de 80% do público interage com a revista nas redes sociais, o que demanda tempo para responder aos questionamentos que variam desde assuntos como a normatização dos textos para submissão até comentários sobre as publicações. “Não é um universo fácil. Aparentemente pode lançar essa imagem, mas é um ambiente que tem muitos desafios”, ressalta Santana.

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Estratégias que deram certo

Santana usa a disseminação para comparar as estratégias adotadas por sua revista na divulgação em redes sociais, pois algumas sementes vão frutificar e outras não. Para entender toda colheita, diz, a equipe precisa medir, analisar e agir. Assim, como uma das primeiras ações, desenvolveram um questionário para entender o perfil do público e adequar a linguagem. A associação da pesquisa, respondida por 40% dos assinantes, com outras métricas de acesso ao blog e redes sociais da RBEFE permitiu o desenvolvimento de manuais sobre o que e como publicar em diferentes canais.

Uma das estratégias adotadas foi a criação de um perfil com biblioteca na rede Mendeley, dicas de leituras e eventos relacionados com a área na página do Facebook e encaminhamento de conteúdo por e-mail. Santana conta que 21% dos acessos da revista vêm de dispositivos móveis (smartphone ou tablet), então foi desenvolvido um aplicativo, em uma plataforma gratuita, para que seus leitores tenham mais comodidade e frequência em suas leituras. “Não temos jornalista ou muitos recursos, mas nada foi ‘desculpa’ para não nos aventurarmos em outras estratégias”, anima Santana.

Já a revista de história de Manguinhos aperfeiçoou algumas ações. Agora, todos os autores são convidados a escreverem um press release para divulgação nos blogs da revista e, segundo Roberta Cerqueira, de dez autores, oito retornam dentro do prazo, por entenderem a importância da divulgação. A editora também elenca outras táticas que estão funcionando: publicação de entrevistas com autores, matérias sobre temas relacionados aos artigos, envolvimento do autor na divulgação do paper, ligação de temas cotidianos com artigos de outras edições, além de contar com a colaboração de “pesquisadores referência” nas temáticas dos artigos divulgados, ou em divulgação científica, e que possam compartilhar e recomendar alguns conteúdos.

A revista informa o público nacional, em português, via blog, Facebook e Twitter, e tem outro blog com conteúdos em inglês e espanhol, com suas respectivas páginas no Facebook e Twitter. Nesse ambiente trilíngue, Cerqueira explica que os públicos possuem características específicas e, consequentemente, pedem conteúdos diferenciados, por isso não ocorre uma “tradução” de textos e sim um duplo trabalho de divulgação. Por exemplo, o leitor internacional interage mais via Twitter, enquanto os brasileiros preferem o Facebook. E o esforço tem recompensas, exemplifica ela, apontando um artigo que tinha apenas 84 acessos, e, após a divulgação, passou a ter 650 visualizações no portal SciELO.

Mesmo diante de desafios, principalmente no financiamento da divulgação, Iamarino destaca que há alternativas, sem que as revistas precisem criar seus próprios canais, como o contato e envio de sugestão de temas para profissionais que já fazem a divulgação científica. Outra saída apresentada pela vice-presidente da ABEC, para as revistas que integram sua base, é a parceria e colaboração com a associação na divulgação de seus conteúdos em conjunto, visto que até entre os critérios da SciELO há a opção dos periódicos fazerem “uso de instâncias próprias ou coletivas”. Este ano a ABEC tomou como política produzir materiais de divulgação para suas revistas por meio do Facebook, Twitter e, futuramente no YouTube, além da divulgação de conteúdos em uma newsletter quinzenal para seus leitores assinantes.

Galleti também aproveitou o momento para anunciar que como comemoração dos 30 anos da ABEC, será lançado no XV Encontro Nacional de Editores Científicos (ENEC), que acontecerá no mês de novembro em Florianópolis (SP), um portal mais moderno para auxiliar suas revistas nessa nova fase de divulgação e aumento de visibilidade.

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Publicado às 25 de julho de 2015 por em Divulga Ciência e marcado , , , .